Como alguém pode ser condenado por violar uma tradição para preservar a vida?

Uma equipe da Jocum (Jovens com uma missão) desenvolve há anos um trabalho junto 'a tribo dos Suruwahá. A aldeia está localizada na bacia do Purus, no Amazonas e hj tem uma população de 137 almas, apenas.

O número pequeno se deve, em grande parte, 'a tradição do suicídio entre esses índios. Segundo a crença deles, é bebendo um preparado feito com uma planta chamada timbó (altamente tóxica) que eles conseguem ver seus antepassados e se comunicar com eles. Bebem e correm pra maloca, para m0rrerem ali por acreditarem que lá moram os espíritos. E quando um deles faz isso, geralmente, o que acontece é que a aldeia se divide: uma parte corre para socorrer o suicida, a outra corre para se matar também.

Parece cômico, mas é terrivelmente trágico para se fazer qualquer brincadeira, e, eu nem tou falando da perpetuação desse povo (que também julgo muito importante), mas da preservação de vidas. Nas palavras de Cristo, "uma alma (entenda-se por "alma" pessoa, ser humano, vida) vale mais do que o mundo inteiro". Engraçado como o valor de uma vida ficou banalizado nos discursos hipócritas.

Pois bem, este grupo de jovens (do qual gostaria de fazer parte) se dedicou ao povo suruwahá, a ponto de abandonar o conforto de suas casas, a companhia de suas famílias, a comodidade urbana e se propôs a estar perto daquela aldeia, a aprender a língua e a se comunicar com eles e a ajudá-l0s a manter vivas suas crianças (o infanticídio também faz parte da cultura deste povo, principalmente quando crianças nascem com alguma anomalia) e a convence-los de viver.

No ano passado, em setembro, foi ao ar uma reportagem no Fantástico que contava a história de Simawani. Uma bebê suruwaha que, pela tradição da tribo, tinha que ser sacrificada ao nascer. Ela nasceu com um tipo de hermafroditismo. Sua mãe teve que abandoná-la para morrer na floresta. Mas a menininha gritou e gritou até que a mãe, Kusiumã, não suportou e decidiu resgatá-la. O pai da menina, Neru, chegou a apontar uma flexa para a cabeça dela, mas não teve coragem.

Resolveram, então, enfrentar a tradição do infanticídio e lutar pela vida da menina. Até o líder da tribo se manifestou favorável a esta decisão (prova de que o trabalho da Jocum está dando certo) e com a ajuda da Jocum, conseguiram chegar ao Hospital das Clínicas em São Paulo, onde, depois de vários exames foi definido o sexo da criança e seria feita a cirurgia de reconstrução do órgão genital feminino. Depois da cirugia, Simawani poderia voltar 'a tribo e ser aceita pela comunidade.

Na época em que saiu a reportagem havia uma imensa briga política e ideológica para que esta cirurgia fosse realizada porque um antropólogo questionou a viagem e fez denúncia ao Ministério Público do Amazonas dizendo que a atuação da Jocum era danosa e perigosa 'a tribo. O presidente da Funai disse na reportagem que a Jocum seria expulsa da aldeia por sua intromissão em assuntos que competem 'a Funasa, que , diga-se, mal dá conta da população não indígena.

Funai e Funasa ainda trocaram farpas antes de decidir quem tinha maior responsabilidade sobre o descaso com os problemas de saúde dos Suruwahá, mas a promessa foi cumprida. Nesta quinta-feira, 09 de março de 2006, o grupo da Jocum foi expulso. Esses missionários são os únicos a entenderem e a se comunicarem fluentemente na língua da tribo.l

A matéria que saiu no Fantástico você acompanha clicando nos link: Reportagem
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